Às margens do lago de Tefé, onde tantos povos vivem da pesca e da relação com as águas, o CPP deu um passo profético com o fortalecimento de sua presença no Regional Norte 1, em um encontro realizado em Tefé (AM)

Julho foi um mês importante para a criação e enraizamento da presença do Conselho Pastoral dos Pescadores e Pescadoras (CPP) na Amazônia. No dia 8, a cidade de Tefé (AM), localizada às margens do lago de mesmo nome, em uma das regiões mais biodiversas e culturalmente ricas da floresta, acolheu uma reunião histórica para a criação e estruturação do CPP Regional Norte 1, que abrange a área da Prelazia de Tefé e outras localidades eclesiais do estado do Amazonas.
O encontro aconteceu na Cúria da Prelazia de Tefé, um prédio histórico construído à beira do lago. Da janela, era possível avistar os botos riscando as águas, enquanto barcos de pesca artesanal cruzavam o espelho d’água em seu vai e vem cotidiano. A força dos rios, os saberes dos povos e os peixes como o pirarucu, tão presentes na vida das comunidades, atravessaram as falas e deram o tom de um momento marcado por escuta, articulação e esperança viva.
Participaram do encontro o bispo da Prelazia de Tefé e presidente do CPP, Dom José Altevir, o bispo auxiliar de Manaus, Dom Zenildo Lima da Silva, além de pescadores e pescadoras artesanais, agentes de pastoral do local e a equipe nacional do CPP. A reunião reforçou o compromisso do CPP com os povos das águas e sinalizou a necessidade de atuação também em outras localidades do Regional Norte 1 da CNBB, onde as comunidades pesqueiras enfrentam desafios intensos ligados à defesa dos territórios, aos impactos socioambientais e à invisibilidade histórica de suas realidades.
Uma pastoral enraizada na Amazônia e na relação viva com as águas
Durante a reunião, Dom Zenildo Lima da Silva, bispo auxiliar de Manaus, destacou a importância de uma atuação pastoral que compreenda a Amazônia a partir de sua vocação profunda. “Então a pastoral dos pescadores vem ao encontro de uma realidade que é a vocação própria desse lugar”, afirmou. Para ele, a construção de uma pastoral na região deve partir da “relação com as águas que a gente aprende das populações tradicionais, dos povos originários, dos povos indígenas e das comunidades ribeirinhas, das escolas que se estabeleceram aqui”, destacou.
O bispo refletiu ainda sobre a água como ser vivo, portadora de dons, e sobre os impactos de um modelo econômico predatório que rompe essa relação. “A água como realidade, como ser, como ente que se relaciona com as pessoas e, portanto, em uma relação de intercâmbio, de troca de dons. E aí pensar a atividade dos pescadores como uma atividade nessa perspectiva de troca de dons. A água que oferece, o ser humano que se faz cuidador da água. Isso cria uma relação harmoniosa”, afirma Dom Zenildo. Segundo ele, “a pastoral dos pescadores no regional Norte 1 tem tudo para ter uma configuração muito peculiar”, capaz de reconhecer “o lugar do homem, da pessoa humana, nessa dinâmica que é a nossa casa comum”, concluiu.
Vozes da Amazônia: esperança e compromisso com a pesca artesanal na Prelazia de Tefé
Ramilda Lima dos Santos, agente de pastoral da Prelazia de Tefé e missionária de São Francisco, expressou entusiasmo com a presença do CPP na região. “A importância desta reunião hoje, do CPP, é que eu vejo que tem um objetivo muito forte dentro desse vínculo do pescador. A gente vai descobrindo cada vez mais a importância que tem o pescador, ou seja, para ter mais conhecimento, mais direito daquilo que muitas vezes foge do nosso esperado”, ponderou. Segundo Ramilda, “o CPP tem muita importância dentro do nosso regional, porque o nosso regional todo é composto desse vínculo da pesca artesanal” e traz “uma grande esperança para dentro da nossa Prelazia”, completou a agente.
Já o pescador Pedro Canisio, da Federação dos Manejadores de Pirarucu de Mamirauá (Femapam), celebrou a chegada da pastoral como um marco de transformação. “Com a entrada do CPP aqui na Prelazia de Tefé, que já é coisa que a gente vem há algum tempo tentando trazer, isso ajuda e fortalece a nossa luta com o pescador”, argumentou. Para ele, a atuação da pastoral dará visibilidade a uma categoria ainda “pouco enxergada pelos grandes comerciantes, grandes pesqueiros de geleiro”. Pedro afirmou: “Hoje essa reunião me deixou muito contente e muito esperançoso que, brevemente, a gente tenha a Pastoral dos Pescadores consolidada aqui na Prelazia”, como um “instrumento de parceria, de ajuda às outras instituições que já tem aqui”. E concluiu: “Para mim, acredito que é um sonho que está começando a se realizar, a vinda do CPP para cá”, finalizou Canisio.
Refletindo sobre o encontro, Juliana Martins, agente do CPP no Regional Norte 1, destacou que a reunião marcou um momento decisivo no processo de articulação da Pastoral na região. “A gente considera essa reunião um momento importante, um momento de luz para a caminhada do CPP, porque foi uma reunião de planejamento e articulação da caminhada futura do CPP aqui no nosso regional”, afirmou. Juliana enfatizou a relevância da presença de Dom Zenildo, bispo referencial das CEBs no Norte 1, e de Dom Altevir, presidente do CPP, que vêm se comprometendo com a consolidação da pastoral. “A gente sente isso também como a continuidade de processo de compromisso com essas comunidades pesqueiras, com os pescadores e pescadoras aqui da nossa região”, concluiu.
Um sopro do Espírito e o início de uma articulação regional
Para Gilberto Lima, secretário executivo do CPP Nacional, a missão na Prelazia de Tefé revelou-se ainda mais fecunda do que o esperado. “Viemos inicialmente com o propósito de participar do Encontro das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) da Prelazia e contribuir no processo de consolidação da equipe do CPP nesse território”, afirmou. No entanto, segundo Gilberto, “o Espírito soprou mais longe”. A partir da reunião com a equipe local e os bispos Dom Altevir e Dom Zenildo, surgiu uma “convocação profética” para ampliar o processo de articulação e formar uma equipe do CPP Regional Norte 1, com apoio da CNBB regional. “Isso significa que, além de fortalecermos a equipe da Prelazia de Tefé, abraçamos agora a missão de animar um processo de articulação mais amplo, envolvendo lideranças de diversas dioceses do Regional Norte 1”, destacou.
Passos firmes para a criação do CPP Regional Norte 1
Em sua fala, Dom José Altevir, presidente do CPP, destacou que a reunião superou as expectativas iniciais. “Nós entramos na reunião presencial, claro, pensando o CPP a partir da Prelazia de Tefé. E saímos da mesma com ideias bem mais amplas e pontuais com relação à criação do CPP no Regional Norte 1”, afirmou. A partir das sugestões apresentadas, surgiu a proposta de mobilizar as igrejas locais para a criação oficial do CPP no regional durante a Assembleia da CNBB Norte 1, prevista para setembro. “A sugestão de Dom Zenildo é interessante: que nós possamos mobilizar de modo que cada igreja local envie representante da comunidade pesqueira ou alguém ligado a essa área para que possa receber uma formação logo depois da Assembleia”, pontuou o bispo.
Dom Altevir também ressaltou a importância da presença de Dom Zenildo e da articulação com as Comunidades Eclesiais de Base. “O trabalho das CEBs está muito próximo também do CPP, então isso é muito importante para que nós possamos dar passos bem definidos nesse sentido”, salientou. Segundo ele, a presença do CPP nacional no Norte 1 foi decisiva para confirmar o compromisso com a criação do novo regional. “O Norte, especialmente o Médio Solimões, é espaço de grande influência quando se trata da questão pesqueira, e nós não temos o CPP funcionando aqui. Todos os bispos praticamente já aderiram à criação do CPP. Cabe a nós, no CPP nacional, unir-nos para que possamos dar a formação necessária na criação deste novo regional”, concluiu.
Agora, o CPP segue firme na missão de fortalecer sua presença e lançar as redes em águas mais profundas, para que todos os pescadores e pescadoras artesanais do Regional Norte 1 encontrem na Pastoral um espaço de apoio, escuta e força. É o início de um caminho comprometido com a construção do Reino de justiça e direitos para a pesca artesanal na região. Que Nossa Senhora da Amazônia abençoe essa missão com esperança e coragem.
Texto e Fotos: Henrique Cavalheiro – Assessoria de Comunicação do CPP